Joga bosta na Geni, joga merda na Geni,
Ela é boa pra apanhar, ela é boa pra cuspir...
Chico Buarque
Rui Grilo
Na década de 80, quando se desenvolve a luta contra a ditadura e pela redemocratização da sociedade, com a ascensão do movimento feminista e contra as diversas discriminações, aumenta também a luta pela escola, conseguindo ampliar o número de vagas e os anos de estudo, mas o fracasso escolar, expresso nos altos índices de evasão e repetência onerava o orçamento do estado e impedia a ampliação do atendimento.
Avolumam-se pesquisas e textos, centrando o foco, ora no aluno, ora no professor, ora no material didático. Segundo alguns autores, a escola refletia os valores burgueses, diferentes das grandes massas populares que adentravam no espaço escolar. O aluno se sentia um peixe fora d’água, discriminado e, com modelos de atitudes e comportamentos muito diferentes daqueles que havia em seu meio. Por outro lado, os professores e a própria escola não estariam preparados para trabalhar com essa nova clientela. É como se alunos de classes sociais diferentes disputassem uma corrida sem condições de igualdade – os pobres de bicicleta ou a pé, e a classe média, com possantes motos. De maneira geral, essas seriam algumas das causas da evasão e repetência.
Nesse período ocupei a função de presidente do comitê de alfabetização de uma fundação que era responsável pela compra e distribuição de livros didáticos. Ao mesmo tempo em que analisávamos as cartilhas mais adotadas no Estado de São Paulo, uma outra equipe, dividida por disciplinas, analisava os principais livros didáticos adotados. Para embasar as nossas análises e difundir os debates, problemas e soluções, eram realizadas oficinas com a participação de equipes técnico-pedagógicas das várias regiões do estado, pesquisadores acadêmicos e as principais editoras de livros didáticos.
Uma outra equipe visitava e acompanhava trabalhos de professores que desenvolviam trabalhos alternativos ou que se destacavam quanto ao desempenho positivo de seus alunos.
Constatamos que havia professores que adotavam bons livros mas não tinham bons resultados e, ao contrário, professores que usavam livros péssimos mas tinham bons resultados.
A Fundação começou a divulgar os principais problemas contidos nos livros adotados e instituiu um concurso para premiar e editar em livro as boas práticas. Quando a Fundação decidiu centrar seu trabalho na formação dos professores, desenvolvendo critérios de seleção dos livros didáticos, houve uma enorme pressão sobre a diretora da fundação, impedindo a continuidade dos trabalhos. Com esse fato, quase toda a equipe se demitiu.
Relatório Delors
No final da década de 90, a UNESCO criou uma comissão para analisar a educação, apontar problemas e soluções. Dirigida por Jacques Delors, antigo ministro da Economia e Finanças da França, contava com quinze especialistas de diferentes partes do mundo. O relatório dessa comissão, com propostas para o século XXI foi publicada com o nome de “Educação – Um Tesouro a Descobrir”.
Segundo esse relatório, a educação deveria estar assentada sobre quatro pilares: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a conviver e aprender a ser.
No entanto, Michael Manley, ex-primeiro ministro da Jamaica, e membro da comissão faz a seguinte crítica: “O mais paradoxal é que a UNESCO apela a que se imaginem novos paradigmas para o século XXI, quando as instituições financeiras multilaterais que derivam, elas próprias, de Bretton Woods e do Sistema das Nações Unidas, conspiram no sentido de fazer com que o modelo, omnipresente há alguns anos, seresuma a fórmula “compressão e regressão”.
Em outro trecho o relatório diz: “... importa por de lado, a todo custo, qualquer tentativa de produtividade a curto prazo que possa comprometer a qualidade do ensino. Assim, o aumento do número de alunos por turma não tem razão de ser quando esse número é já muito elevado... Finalmente, é preciso não esquecer que qualquer medida tendente a baixar o nível de exigência no recrutamento e formação de professores é prejudicial à qualidade do ensino e compromete gravemente o futuro.”
Também afirma que “... o desenvolvimento das novas tecnologias não diminui em nada o papel dos professores, antes pelo contrário; mas modifica-o profundamente e constitui uma oportunidade que devem aproveitar (...) o professor já não pode, numa sociedade de informação, ser considerado como o único detentor dum saber que apenas lhe basta transmitir. Torna-se, dalgum modo, parceiro dum saber coletivo, que lhe compete organizar situando-se, decididamente, na vanguarda do processo”.
Mas como pode ele estar na vanguarda do processo se é alvo de todo tipo de chacota e as próprias autoridades educacionais lhe negam a chance de se submeter à aprovação de um cargo efetivo? Hoje grande parte dos professores da rede estadual são professores ACTs – admitidos em caráter temporário, e, muitos deles estão há mais de dez anos na rede. Qual é a responsabilidade perante a população, quando as autoridades submetem seus professores à vexames, afirmando que um grande número teve nota zero e, ao mesmo tempo manteve-os durante tanto tempo lecionando? Nenhum professor pode lecionar sem ser graduado; então, em que tipo de escola foi formado esse professor que tira zero? A quem cabe a competência da autorização para abrir e para continuar a funcionar uma escola desse tipo?
É sabido que uma pessoa que só recebe críticas, a tendência não é melhorar mas se apequenar, perder a autoestima. O professor é a Geni da vez.
Rui Grilo
ragrilo@terra.com.br



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